sexta-feira, setembro 30, 2005

Tinta Mágica

O aparo, ao comandar o pulso, esboça barbatanas de peixes que mais parecem pássaros, rostos com fechaduras de porta, nacos de cidade que até espantariam Calvino.

quinta-feira, setembro 29, 2005

Intranquilidades

Nervos eriçados, como se fossem músculos de gato, escrevem o quotidiano numa caligrafia tão pouco firme que até parece saída dos distantes bancos d’escola.

quarta-feira, setembro 28, 2005

Era Uma Vez

Umas abelhas búlgaras, que recusavam debruçar-se sobre os tabuleiros dos xadrezistas de jardim, zumbiam em cirílico por cima do almoço.

Pinturas Anónimas

Riscaram o céu com branco de nuvens – o mesmo tipo de gesto com que se pintam laranjas nas árvores do pomar.

domingo, setembro 25, 2005

Manias de Biblioteca

“Passo pelos longos corredores, de cima a baixo os livros nos seus túmulos. São milénios de balbúrdia, tagarelice infindável, filósofos, investigadores, poetas, doutores da Igreja, moralistas, juristas, políticos, algaraviada infernal, interminável algazarra através das eras – estão imóveis nos seus túmulos irrisórios.”
(Vergílio Ferreira)

sábado, setembro 24, 2005

Miniatura Óptica

Um farrapo de nuvem entra na pupila e esconde o brilho da manhã.

sexta-feira, setembro 23, 2005

Andorinha Andarilha

Arribar. Partir. Por vezes, sorrindo...

quinta-feira, setembro 22, 2005

Homem de Mármore

Um longo fio de horas em pé, esperando por um Godot qualquer, confunde a silhueta estática com a rígida estátua vizinha.

terça-feira, setembro 20, 2005

Palavras Poderosas

Na franja do lençol, em caligrafia garatujada, uma pequenina bruxa enxota-nos os sonhos matinais.

segunda-feira, setembro 19, 2005

Evidências

A beleza de um riso dispensa adjectivos.

Borracha Urbana

Afundaram um automóvel de colecção num aquário seco de peixes com a mesma facilidade com que se risca uma palavra mal escrita em folha de papel.

sexta-feira, setembro 16, 2005

Impressões Digitais

“As suas mãos esguias, delicadas e nervosas fazem pensar no póquer ou na roleta,mas também em sapientes contactos com porcelanas, pergaminhos, instrumentos musicais, e com meias femininas, sedas, rendas e fechos duros de colares.”
(Fruttero & Lucentini)

Asas Sossegadas

No tapete de águas verdes, como se a realidade imitasse o mar plástico de Fellini, e perante a alheada atenção das casas vestidas de pijama, a gaivota empoleirada num mastro parecia meditar sobre Veneza.

quinta-feira, setembro 15, 2005

Luares

Curiosa como pupila infantil, a lua espreitava os pensamentos que andavam a passear pela varanda...

quarta-feira, setembro 14, 2005

Dourados Dias

Entardecer d’ouro num’alma plúmbea.

Fantasia com Fiama

Embarquei um verso da Fiama num eléctrico com carris que pisavam uma lua feita de pautas e toda a hera que canta nos jardins.